Deadline

Postado por: Trombetas | Marcadores: , , , , , , | às 16:16

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Simião Castro

Década de 50. Estados Unidos. Columbia Broadcasting System (CBS), uma das redes de televisão mais influentes do país. E isso, quando a televisão apenas começava a se firmar como veículo de massa nos EUA.

Nesse ambiente, o jornalista Edward R. Murrow (David Strathairn) resolve mostrar para a nação atividades ilícitas do senador Joseph McCarthy durante suas investigações anticomunistas. Murrow denuncia, em seu programa noturno semanal, que o senador acusava e mandava prender supostos comunistas sem provas, em nome da liberdade do país.

George Clooney (diretor e intérprete de Fred Friendly) embarca na história real de Murow, chamado de Ed pelos amigos, e a transforma no longa “Boa Noite e Boa Sorte”, (Good Night and Good Luck) lançado em 2005, indicado a 6 Oscar em 2006.

Apesar de não levar nenhuma das estatuetas, o filme faz jus a todas as indicações e a ao menos mais uma: trilha sonora. O jazz ajuda a transportar o expectador para a época, e ainda serve como acabamento para os planos cênicos, ora ousados, ora conservadores.

O diretor se utiliza de muitos planos de meio conjunto (mais de uma personagem e visão do cenário), bem como de meios primeiros planos (enquadramento da cintura para cima da personagem). Isso, mais os close ups, faz toda a diferença. A impressão é que se está sempre muito próximo dos atores. Como se o expectador fosse parte do filme, estivesse dentro dele.

Mas não são apenas esses elementos que levam o público para dentro da tela. Clooney mostra a que veio já na primeira cena, quando o Jazz começa a tocar e a imagem se abre em preto e branco. Não deixa de ser um susto a princípio. Um filme em plenos anos 2000 em preto e branco? Mas o efeito que causa é primoroso. O ambiente, mais a trilha sonora, são como uma máquina do tempo. Quando você se dá conta, está nos anos 50 também.

Outra grande solução encontrada pelo diretor foi utilizar imagens do arquivo da época em passagens importantes da trama. Além desse recurso certamente ter poupado gastos com locações, cenários e contratação de atores, ele contribuiu para a construção da narrativa.

Contudo, a técnica seria pouco para amparar um filme como este. É necessário história. Será então possível que o Macartismo seja suficiente para proporcionar tal teia? Não. Mas a forma em que ele foi tratado, essa sim, é o segredo. 

Abordar o tema de dentro da redação da televisão, narrar os acontecimentos pelas palavras de um personagem real, como Edward R. Murrow, dá verossimilhança à história. Mas poderia também ter destruído o ambiente preestabelecido. A redação pode ser um lugar hostil, onde o tempo é inimigo de todos, e onde a correria do trabalho pode tornar as pessoas ranzinzas e ríspidas.


O que ameniza esse aspecto é explorar o conteúdo humano de Murrow. Aquele que se propôs a ir contra um dos homens mais poderosos dos Estados Unidos, com denúncias incisivas e diretas, sem receios e com um rigor ímpar, é o mesmo homem que parece carregar o mundo nos ombros. O mesmo que luta contra os conflitos de sua profissão diariamente. E o mesmo que começa a se perguntar se a televisão estaria, já àquela época, cumprindo com seu dever frente à sociedade.

Essa discussão é apresentada logo nos primeiros minutos do filme, e nunca foi tão atual. Murrow discursa em um tributo a ele e parece falar para o futuro. Apesar do preto e branco, a máquina do tempo foi ligada novamente, e a plateia não é mais a formada pelos convidados da festa, e sim pelos espectadores do filme que se identificam com o que está sendo dito na tela. A reação de ambos os públicos provavelmente não seria diferente naquela situação. Choque.

Os rumos que a TV toma na época, tornando-se cada vez mais um veículo de propagação de entretenimento, e cada vez menos de informação útil à sociedade, preocupavam o jornalista e continuam em pauta ainda hoje, mais de meio século depois. Enfim, um filme com cara de antigo, mas que de velho não tem nada. 

Com isso, o que resta a dizer é: Boa noite... E boa sorte!


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